sexta-feira, 27 de fevereiro de 2009

mais uma noite

tudo aconteceu rápido e desabamos cada qual para seu lado da cama, separados por um lençol amarrotado e suor, a cama ainda quente de nossos corpos. fiquei em silêncio contemplando o teto, espelho que mostrava a mim mesmo. mal olhei para ela. estava absorto em minha imagem. nu, estendido, exausto, os olhos buscando os olhos que se afundavam na opacidade do espelho. 

chega. 

sentei-me e tateei por entre minhas roupas no chão. encontrei o indispensável maço de cigarros e o isqueiro. 

"um trago?"

ela já dormia. 

concentrei-me em inalar e soltar a fumaça como se fosse um processo complexo, uma atividade essencial e que poderia resultar em explosão nuclear em caso de erros. era tudo a quietude naquele quarto. às vezes eu me distraía de minha própria alucinação solitária e ouvia a respiração dela, mas não importava. por dentro, sentia pungente algum desejo, cumprido, alguma missão, fracassada. 

não lembrava mais ao certo, até por evitar contar, quanto tempo havia passado desde que entrara para esse clube. o dos que vagam pela noite, solitários ou em rodas de amigos, atrás daqueles vinte minutos de êxtase. o complicado era depois. encontrar-se em um estranho quarto de motel ao lado de uma semi-desconhecida, aguardando o passar do tempo ou o momento da próxima foda antes de inventar alguma desculpa para simplesmente sair dali e encontrar novamente o caminho do descaminho.

procurei pelo celular entre as roupas no chão, disfarçadamente. apertei um botão. 
o toque.
dois toques.
atendi.

- oi. mãe? ah...ah, que merda...peraí...já tô indo praí !

virei pro lado. dormia. acordei-a suavemente. 

- pri, preciso ir. um problema em casa. vamos. ou então deixo pago e você fica dormindo. 

ela, sonolenta, pareceu não entender muito. acenou um sim e virou de lado. 

merda.

peguei minhas coisas, botei a roupa. fiquei contemplando aquela mulher a dormir. era bonita. nada de extraordinário, nenhuma modelo. mas bonita. simpática, acabava conquistando a gente. fiquei com pena. não deveria ao menos anotar o telefone dela? 

peguei a chave do quarto e saí. 

passei na recepção. cartão de débito, tudo acertado. ganhei a rua.

ao virar a esquina, percebi. 

havia ganho a rua. e perdido algo lá atrás. 

joguei o que sobrava do cigarro na calçada e continuei minha caminhada.